quinta-feira, 17 de junho de 2010

Treinamento anaeróbio para o desempenho de jogadores de futebol profissional

Introdução

Não há dúvida de que o futebol neste século é visto por vários outros ângulos que não somente o da paixão, despertador em todos os povos do mundo, sobretudo em nosso país. Hoje, o futebol, além de ser o esporte mais emocionante entre todos, é também “business”, movimentando milhões de dólares e euros em todos os continentes. Com isso, não se admite que seja tratado sem profissionalismo, estando aqueles que assim não pensam fadados ao fracasso.

Dentre todas as vertentes que envolvem esse universo está a preparação física, onde não raro se ouve principalmente entre leigos a seguinte questão: será que a seleção brasileira de futebol, tricampeã no México em 1970 teria hoje o mesmo sucesso, visto que o futebol era mais cadenciado, “menos força”, sobressaindo a habilidade dos jogadores?

Temos ainda diversas outras questões que envolvem diretamente o treinamento, por exemplo: quais os métodos de preparação física mais adequados, quais os volumes e intensidades necessários para a melhor adaptação aos esforços exigidos durante uma partida, quais valências físicas devem ser mais trabalhadas e, sobretudo, a maior inquietação, o futebol é predominantemente aeróbio ou anaeróbio?

Neste artigo desejamos deixar bem claro a importância do treinamento anaeróbio para o desempenho de jogadores de futebol profissional, devendo ser preocupação de todos os preparadores físicos quando do planejamento de um macrociclo de treinamento, atentando para a importância dos testes de avaliação específicos para esse tipo de metabolismo, bem como os meios e métodos de preparação mais adequados para a melhora da performance dos atletas durante as partidas de futebol.

Aspectos gerais de um jogo de futebol

O futebol, esse fascinante jogo que move multidões e é paixão em todo o mundo, chegou ao Brasil em 1894 pelas mãos de Charles William Miller, que apesar do nome era paulistano nascido no bairro do Brás. Charles Miller desembarcou em São Paulo vindo da Inglaterra trazendo consigo duas bolas de couro, uniformes e um livro de regras. Nascia então para os brasileiros o esporte que se tornaria uma referência nacional.

A primeira regra, de um total de dezessete, trata do campo de jogo e estabelece que as partidas podem ser disputadas em superfícies naturais ou artificiais, de acordo com o regulamento de cada competição, sendo suas medidas definidas em um mínimo de 90 metros e um máximo de 120 metros de comprimento e um mínimo de 45 metros e um máximo de 90 metros de largura.

Os jogadores de futebol, distribuídos dentro desse espaço retangular e divididos por posições, executam as mais diversas funções táticas de acordo com a necessidade de cada jogo, o que indubitavelmente leva às mais diversas alterações do ponto de vista fisiológico em seus atletas praticantes.

Aspectos fisiológicos de um jogo de futebol
Barbanti (1996) conceitua o futebol como sendo uma modalidade esportiva intermitente, com constantes mudanças de intensidade e atividade, e a imprevisibilidade dos acontecimentos e ações durante a partida exige que o atleta esteja preparado para reagir aos diferentes estímulos, da maneira mais eficiente possível.

Assim, podemos conceituar que uma partida de futebol é constituída por uma alternância de esforços e ações variadas em formas e intensidades, o que caracteriza um esporte intermitente. Os jogadores realizam esforços aleatórios de duração e intensidade variável, ocorrendo fases de intensa participação (sprints, saltos, mudanças de direção, finalizações) intercaladas a períodos de menor intensidade (caminhada, trote de baixa intensidade).

É certo que as necessidades energéticas exigidas por jogadores de futebol, de acordo com suas funções e ações durante uma partida, variam muito de acordo com o posicionamento em campo. Suas funções e distribuições táticas podem mensurar qual a necessidade energética e qual será a principal fonte de energia para cada ação durante a partida. Assim sendo, para as diversas tarefas que se impõem durante uma partida, temos que a liberação de energia também será proveniente de metabolismos diferentes, ou seja, de sistemas energéticos diferentes.

Sistemas energéticos

Segundo Hernandes Junior (2002) sistema energético é a via metabólica por meio da qual a musculatura obtém energia à contração muscular. Foss e Keteyan (2000) ensinam que o combustível necessário para o fornecimento de energia no corpo humano é o ATP, sendo este formado por uma base de adenosina e três grupos fosfatos.

Porém, segundo a literatura, o estoque de ATP intramuscular é muito baixo e só suficiente para que o indivíduo possa executar de 3 a 5 segundos de atividades físicas máximas, sendo necessário uma ressíntese contínua de ATP.

Conforme Aoki (2002) a ressíntese imediata de ATP é realizada a partir da união dos produtos recém formados pela sua quebra: a adenosina difosfato e o fosfato. Além desses compostos, a ressíntese de ATP depende da liberação de certa quantidade de energia proveniente da quebra dos fosfatos de creatina (CP). Essa quebra é capaz de suprir por alguns segundos (aproximadamente 10 segundos) aumentos abruptos da demanda energética.

Importante ficar claro que assim como o estoque de ATP, o estoque de fosfato de creatina armazenado no corpo humano também é limitado, ficando dessa forma como principal fonte de energia para a ressíntese de ATP os macronutrientes presentes em nosso organismo (carboidratos, lipídeos e proteínas).

Dentro dessas estruturas de sistemas energéticos estão presentes os diversos esportes e atividades físicas existentes. Saber qual é a maior demanda energética solicitada pelo meu esporte e, sobretudo, qual a via metabólica para ressíntese dessa energia, é condição indispensável para o planejamento e execução de um treinamento ideal para que fisicamente o atleta esteja preparado para as solicitações daquela modalidade. Sem isso, a chance de fracasso na elaboração de uma periodização é total.

Predominância metabólica de uma partida de futebol

Segundo Gomes (2008) para se ter o correto entendimento da carga fisiológica adequada ao jogador de futebol é necessário observar além da distância total percorrida durante o jogo, outros fatores como a intensidade das ações dentro da distância total percorrida, porcentagem da distância percorrida em intensidade máxima no primeiro e no segundo tempo, duração, distância e número de ações motoras de alta intensidade, número de sprints, pausa entre os sprints, duração das ações com e sem bola, pausa entre essas ações, formas de deslocamento, frequência cardíaca de jogo, concentração de lactato, porcentagem de consumo máximo de oxigênio, etc.

Mas, afinal, qual é a predominância metabólica em uma partida de futebol?

O futebol caracteriza-se por ser uma atividade predominantemente aeróbia, mas na qual os atletas dependem de esforços anaeróbios e intensos para almejar sucesso na atividade competitiva (Bangsbo, 1994; Reilly, 1997), sendo que à medida que avançam nas categorias, verifica-se um maior predomínio da atividade anaeróbia (Silva et al, 1997) e um percentual maior de movimentação em velocidade máxima (Ekblon, 1986).

No futebol moderno, cada vez mais verificamos a importância de termos um jogador rápido e forte, capaz de suportar as altas exigências de uma partida e ainda mantendo um elevado nível de competitividade, ou seja, capaz de suportar e resistir às condições fatigantes de um jogo de futebol profissional.

Nesse contexto, podemos concluir que o futebol é um esporte onde o predomínio metabólico nos atletas é o aeróbio, porém, onde o metabolismo anaeróbio é o determinante, razão pela qual deve ser trabalhado e em hipótese alguma negligenciado pelos preparadores físicos, pois, como determinante, é um dos fatores que fará a diferença em uma competição de alto nível e exigência atlética.

A resistência anaeróbia e sua importância no futebol

Para a maioria das modalidades desportivas, o desenvolvimento da resistência anaeróbia tem um significado muito importante, sobretudo ao futebol, modalidade que como já vimos é de caráter intermitente e acíclico. Tendo o metabolismo aeróbio como predominante, mas o anaeróbio como determinante, o futebolista necessita e muito que essa capacidade esteja bem treinada.

A capacidade anaeróbia bem treinada estabelece ao futebolista uma base funcional para o aperfeiçoamento de diversos aspectos, mas principalmente o deixará mais adaptado às ações e exigências do futebol e com uma maior tolerância à fadiga.

Em uma partida de futebol, como já vimos, temos diversos tipos de deslocamento, feitos em diversos tipos de intensidade, onde a melhor adaptação ao metabolismo exigido tornará o jogador mais eficiente dentro daquilo que dele se espera.

O metabolismo anaeróbio, sobretudo o glicolítico, tem importância ímpar dentro dessa análise, pois uma grande parte da atividade dos movimentos dos futebolistas está baseada na desintegração anaeróbia do glicogênio. Sabemos a importância da capacidade física velocidade em todos os esportes. Porém, de nada adiantará termos um atleta extremamente veloz no futebol que consiga dar apenas alguns sprints, sendo logo vencido pela fadiga e pela falta de adaptação às exigências específicas do esporte.

Com isso fica clara a importância do treinamento anaeróbio para o desempenho de jogadores de futebol profissional, uma vez que a intensidade de trabalho do jogador durante uma partida pode diminuir e até mesmo ser interrompida quando houver uma grande concentração de lactato.

Conclusão

O futebol é um jogo caracterizado por ações motoras rápidas e potentes. Embora em grande parte do tempo os atletas caminhem ou trotem, são os saltos e os sprints curtos e intervalados, com intensidades altas e moderadas, que definem as disputas de bola e muitas vezes fazem a diferença entre fazer um gol ou tomá-lo.

O trabalho que é imposto aos atletas nas partidas exige um padrão orgânico elevado, principalmente quanto aos parâmetros anaeróbios. Nesse quesito, o papel da preparação física no futebol assume posição fundamental: ou a modalidade é entendida em todas as suas nuances físicas, ou a preparação dos atletas será insuficiente para atender a demanda exigida.

Hoje os preparadores físicos lidam diariamente com um desafio, pois, aliada às dificuldades impostas pelo calendário esportivo anual das competições oficiais de futebol, temos diferentes fatores que interferem no planejamento e na preparação de uma equipe.

Isso faz com que a margem de erro tenha que ser cada vez menor. Erros primários na elaboração de um plano ou de uma periodização não podem ocorrer. Analisar e conhecer a modalidade, projetar os objetivos a serem alcançados e treinar adequadamente os atletas de acordo com as exigências do esporte é obrigação dos profissionais da área de preparação física, sobretudo no futebol profissional.

Autor:Eduardo Luiz Tavares

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